Quando nos abstemos de participar, como saber se essa não participação é grito de revolta ou a mais pura indiferença?
Na minha opinião, sempre achei que quem não vota é porque não quer saber, porque está bem como está, porque quem está lá a fazer, está a fazer bem feito.
Abstenção legitíma!
Neste tempo de galope desenfreado, acreditou numa verdade que se imporá por si mesma, tanto melhor se algém lhe for abrindo caminho. E viu na revolução a oportuna ocasião de gritar contra a injustiça e a mentira, como se tais coisas, em absoluto, existissem, a ocasião de chamar a terreiro os poderosos, e vê-los assim, rídiculos e frágeis, sem peitorais de alfaiate, assustados, de calças na mão, como qualquer um. Gaspar ainda não descobriu que neste mundo só há injustiça quando uma vítima dela tem consciência. E que o poder só mente quando os discursos esbarram no riso geral e provocam o desprezo do povo. Afora isso, o poder exerce-se, e legitima-se a si mesmo, e ninguém se pode queixar dele. A injustiça e a mentira, referendadas pelo silêncio geral, transformam-se em ideologia e em catecismo, são a legalidade.
Jorge Carvalheira, "As aves levantam contra o vento", edições quasi
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