quinta-feira, 25 de junho de 2009

Uns versos quaisquer

Vive um momento com saudade dele

Já ao vivê-lo . . .

Barcas vazias, sempre nos impele

Como a um solto cabelo

Um vento para longe, e não sabemos,

Ao viver, que sentimos ou queremos . . .

Demo-nos pois a consciência disto

Como de um lago

Posto em paisagens de torpor mortiço

Sob um céu ermo e vago,

E que nossa consciência de nós seja

Uma cousa que nada já deseja . . .

Assim idênticos à hora toda

Em seu pleno sabor,

Nossa vida será nossa anteboda:

Não nós, mas uma cor,

Um perfume, um meneio de arvoredo,

E a morte não virá nem tarde ou cedo . . .

Porque o que importa é que já nada importe . . .

Nada nos vale

Que se debruce sobre nós a Sorte,

Ou, tênue e longe, cale

Seus gestos . . . Tudo é o mesmo . . . Eis o momento . . .

Sejamo-lo . . . Pra quê o pensamento? . . .

Fernando Pessoa

1 comentário:

Jeremias disse...

lindo poema Amiga.
obrigado por ser um oásis do meu coração, com as suas palavras que sempre me refrescam.
obrigado.
Um beijo
António